segunda-feira, 23 de junho de 2014

A pungência da inevitabilidade



Constitui esta notícia de incidente nas piscinas oceânicas de Oeiras um dos temas centrais da nossa mensagem: fim aos halogénios na nossa água! Os riscos de manipulação de químicos perigosos altamente reativos ficou bem patente.

Segundo a renascença:
"Segundo fonte do Comando Distrital de Operações de Socorro de Lisboa, a reacção química produziu-se num recipiente colocado na casa das máquinas da piscina oceânica de Oeiras, junto à praia da Torre, tendo sete pessoas "sentindo-se mal" ao respirarem o gás entretanto libertado. "
Deu-se,então, uma reação química num recipiente na casa das máquinas...tendo sete pessoas sentido-se mal ao respirar o gás libertado...hum!
Ok. Para qualquer pessoa menos atenta esta notícia até parece verosímil. Está exposta de forma bem vaga deixando ao incauto o essencial - a notícia, mas omitindo o necessário - a verdade.
Vejamos. Como se dá uma reação química? Em primeiro lugar, como em todos os fenómenos naturais,é preciso estar em presença de pelo menos dois químicos mutuamente reativos: um ácido e uma base. Nenhum químico reage sozinho se não for exposto às condições adequadas a uma reação, seja uma alteração de temperatura ou a introdução de um reagente e/ou um catalisador. Portanto, quando na notícia da Renascença é afirmado que se produziu uma reação química num recipiente...alguém ou alguma coisa provocou essa reação química! Neste caso concreto, sabemos tratar-se de erro humano, de acordo com a mesma fonte. Conclui-se que ALGUÉM provocou uma forte reação química. A questão que se coloca é que reação química foi essa? Considerando que se trata de uma grande piscina de água salgada, melhor, duas, uma para crianças com (aprox.) 132 m3 e uma para adultos com (aprox.) 2400 m3, num total de 2532 m3 de volume de água. A questão do volume de água é relevante para percebermos que, embora os químicos introduzidos na água devam respeitar as normas europeias de  partes por milhão (ppm), os volumes de químicos armazenados e manipulados são importantes e, logo, extremamente perigosos uma vez que falamos de halogénios. A mesma fonte refere que um dos químicos envolvidos foi hipoclorito. Hipocloritos são sais base e existem vários, que podem ser usados na desinfecção da água. Neste caso, e por se tratar de uma piscina exterior, trata-se de hipoclorito de sódio. Para quem não conhece, o componente principal da lixívia, com a fórmula química NaOCl. 
As piscinas de água salgada são tratadas com este composto por duas razões de forca maior: é o melhor desinfetante ao preço mais baixo, com a adição de ser também um excelente oxidante. Porém, em piscinas exteriores tem um problema: é suscetível à radiação UV que o neutraliza e a subida da temperatura da água faz com que se evapore. Dito de outra forma, mais próxima da realidade, a água é um solvente por excelência e reage aos químicos nela introduzidos. No caso do hipoclorito de sódio, ao entrar em contacto com a água dá-se a seguinte reação (a níveis de pH perto do neutro -                NaOCl + H2O --- Na+  +  OCl-  +  H2O
O ião hipoclorito OCl- estabelece um equilíbrio com os iões de hidrogénio, dependendo do pH, ou seja, dependendo da concentração de iões de hidrogénio na água. Uma parte do cloro disponível reage com a água para formar ácido hipocloroso, iões de hipoclorito e acido cloridrico (simplificando as reações químicas envolvidas para efeitos de exposição). Introduzindo a radiação solar UV, este residual é substancialmente reduzido. Em adição, os banhistas são os principais portadores de microrganismos e matéria orgânica para a água, os quais não são oxidados ou neutralizados se o residual livre de cloro for grandemente consumido pela radiação UV. Existe uma forma de estabilizar o cloro livre, introduzindo ácido cianúrico que  como uma barreira UV, permitindo que o cloro residual livre atue sobre os contaminantes. 

O que nos leva ao princípio da nossa história. Uma coisa são reações químicas em meio aquoso, outra são reações químicas sem meio aquoso, sem diluição. Quanto maior for a concentração dos dois reagentes mais violenta é a reação. Uma reação química é, essencialmente, a troca de protões entre os reagentes. Um liberta, o outro aceita. São processos normalmente rápidos nestas circunstâncias e, portanto, de extrema violência. Um excelente exemplo de reação química violenta é a explosão da pólvora, por exemplo. Neste caso, lidamos com reagentes que são essencialmente gases. Como tal, libertam-se no processo formando nuvens densas altamente tóxicas e corrosivas. 

Sem saber exatamente o que se passou diria que não estarei longe da verdade. Provavelmente o 'técnico' responsável pela introdução dos químicos não recebeu a formação necessária para fazer o seu trabalho e ninguém lhe terá explicado o b-a vá das reacoes químicas: nunca misturar bases com ácidos e nunca dissolver água no ácido mas, sim, o oposto.
Provavelmente um erro de manipulação terá levado ao contacto acidental dos dois reagentes...quem sabe a não ser os intervenientes diretos? O facto é que existe uma necessidade pungente de evitar a pungência da inevitabilidade da utilização de químicos na água que usamos e bebemos. Este incidente foi apenas uma pequena demonstração. Agora imagine-se que acidentalmente se introduz uma quantidade excessiva destes químicos na água... eu poderia acontecer? O risco de erro está sempre presente e há que reduzi-lo ou eliminá-lo suprimindo a introdução de químicos..sabendo que existem alternativas 'verdes' e saudáveis à nossa disposição.

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